Economia circular e clima: soluções para a gestão de resíduos no Brasil e no mundo

A gestão de resíduos é hoje um dos maiores desafios urbanos, ambientais e sociais do mundo, e também um dos campos de maior potencial para avanços na ação climática no Brasil. Para contribuir com esse avanço, a BVRio promoveu, durante a Rio Climate Action Week, o evento Gestão e Economia Circular de Resíduos”, que reuniu alguns dos principais formuladores de políticas, especialistas, ativistas e financiadores do país em um dia inteiro de debates e trocas de experiências. O auditório do CCBB Rio de Janeiro ficou lotado, recebendo mais de 140 pessoas.

Assista à íntegra no canal da BVRio no YouTube

O encontro contou com 19 palestrantes de diferentes áreas. Estiveram presentes representantes dos Ministérios do Meio Ambiente e do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, da Secretaria de Estado do Ambiente e Sustentabilidade do RJ, além de WWF-Brasil, Firjan, Comlurb, L’Oréal, O Boticário, Wise Plásticos, Cazoolo Lab, Sistema B, Black Forest, Orla Rio, cooperativas de catadores e da Aliança Internacional de Catadores. A diversidade de atores destacou como os diálogos locais e globais precisam caminhar juntos para gerar impacto.

Políticas e o Tratado Global do Plástico

O evento ocorreu poucas semanas após a mais recente e inconclusiva rodada de negociações do Tratado Global do Plástico (INC).

No primeiro painel do dia sobre o cenário internacional, Carlos Fonseca, do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, ressaltou a urgência de alinhar a política nacional às negociações globais, observando que esse debate internacional ajuda a diferenciar governos mais engajados dos menos dispostos a avançar, gerando informação estratégica para a diplomacia. “O Brasil é o maior produtor de plástico da América Latina e o quarto gerador de resíduos do mundo. Boa parte acaba no oceano. Precisamos fechar essa torneira”, afirmou Fonseca, afirmando que o MMA trabalha a proposta de “um Fundo Global para o Plástico, com recursos não reembolsáveis para que os países implementem políticas públicas e empréstimos concessionais para apoiar a transição da indústria e fortalecer a coleta e reciclagem.”

Maria Accioly, especialista em economia circular da BVRio, acrescentou: “Mesmo sem um tratado global, o processo dos INCs já trouxe um resultado positivo ao atrair a atenção pública e gerar intensas discussões sobre os problemas causados pela poluição plástica.”

 

Mauricio de Moura Costa (BVRio) moderou a sessão “Cenário nacional: regulação e implementação no Brasil”, que teve como palestrantes Mona Rotolo (Secretaria de Estado do Ambiente e Sustentabilidade – SEAS), Edson Freitas (ANCAPRE – Associação Nacional da Cadeia do Reciclo) e Carolina Zoccoli (Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro – Firjan).

A cadeia de valor dos resíduos

O encontro também discutiu como os elos da cadeia de valor dos materiais podem impactar uns aos outros, incentivando uma revisão crítica dos processos atuais para facilitar soluções em toda a cadeia. “Essa convergência é fundamental: só assim conseguiremos construir soluções que tornem os produtos mais circulares e sustentáveis, promovendo impacto positivo em toda a cadeia”, afirmou Pedro Succar, especialista em economia circular da BVRio.

Do lado das empresas de bens de consumo, Maria Eduarda Figueiredo, da L’Oréal, destacou o compromisso global de reduzir em 50% o uso de plástico virgem até 2030, mas apontou os desafios no Brasil: “O grande desafio é garantir rastreabilidade e segurança dos plásticos reciclados em contato com a pele do consumidor.”

Bruno Igel, da recicladora Wise Plásticos, ressaltou as limitações do setor: “Plástico não é tudo igual. Cada tipo exige um processo específico. O Brasil coleta mais de 90% dos resíduos, mas o grande desafio é viabilizar, junto com cooperativas, uma economia circular em escala compatível com a geração de resíduos.”

As demandas corporativas também se conectam à gestão pública. Marcelo Sicri, da Comlurb, afirmou: “Existe um desafio de aumentar em mais de dez vezes a coleta seletiva, fomentando o mercado de catadores, profissionalizando-os e oferecendo melhores condições de trabalho.”

Pedro Succar (BVRio) moderou a sessão “Perspectivas de diferentes elos da cadeia de valor dos resíduos”, que reuniu Marcelo Sicri (Comlurb), Marta Nistaldo (CoopIdeal), Bruno Igel (Wise) e Maria Eduarda Figueiredo (L’Oréal Brasil).

O papel vital dos catadores

As falas dos catadores trouxeram a dimensão social para o centro do debate. Marta Nistaldo, da CoopIdeal, destacou: “100% dos cooperados se identificam como pessoas negras e 70% são mulheres, mães. Nosso trabalho é dar dignidade e mostrar que eles são trabalhadores da cadeia da reciclagem, com papel essencial para a sustentabilidade.”

Ela também destacou o desafio urbano mais amplo: “As cooperativas de reciclagem desempenham uma função socioambiental crucial nas cidades. Só no município do Rio, são 10 mil toneladas de resíduos por dia enviadas ao aterro de Seropédica: o equivalente a mil caminhões, segundo dados da Ciclo (2024). Desse total, cerca de 33,6% corresponde a recicláveis secos que poderiam ser recuperados pelas cooperativas em vez de descartados.”

Michel Santos, do WWF-Brasil, reforçou a importância de valorizar os catadores e ampliar a ambição climática por meio da gestão de resíduos, desde a redução na geração até a inclusão social.

Soluções em prática

O evento também apresentou uma vitrine de soluções já implementadas, evidenciando que a economia circular no Brasil está em construção. Participaram dessa mostra Orla Rio, Black Forest / Reverse Lab, Cazoolo (Braskem), O Boticário Lab e iniciativas da BVRio, como o projeto de profissionalização de cooperativas e o Programa Pescando Resíduos.

As apresentações reforçaram que a inovação já está em curso, mas precisa de escala e políticas públicas consistentes para se consolidar. Ficou evidente que a economia circular de resíduos não é apenas uma agenda de gestão urbana: trata-se de um eixo central da luta contra as mudanças climáticas.

 

A “Mostra de soluções de economia circular” apresentou cases e iniciativas com Nathália Barreto (Orla Rio), Rafaela Craiser (Black Forest / Reverse), Fábio Sant’Ana (Cazoolo – Braskem), Ísis Westphal (O Boticário) e Pedro Succar (BVRio).