Uma breve análise sobre a evolução do direito de propriedade no Brasil

Por Daniela Pires e Albuquerque, Gerente Jurídica da BVRio.

  1. O Regime Sesmarial

Como não podia ser diferente, a constituição do Direito de Propriedade do Brasil está intrinsecamente ligada ao Direito Português. Desde o período da colonização, pela ausência de uma séria política que privilegiasse a concessão de terras de forma igualitária, a história da propriedade do Brasil foi baseada pela ilegalidade ao uso das terras brasileiras.

Portugal, com o objetivo de povoar o território brasileiro, implantou o Sistema das Capitanias Hereditárias sob o Regime Sesmarial (ou Concessão de Sesmarias) no século XVI. Tal regime, sob o comando do navegador português Martim Afonso de Souza, concedia a ele o poder de oferecer terras àqueles que poderiam cultivá-las, obrigando-os a manter as terras produtivas ou transmiti-las (mediante enfiteuse ou arrendamento), obtendo como contraprestação o pagamento de uma renda.

Quando a posse da terra era concedida e, se houvesse a sua subutilização da gleba, ocorreria a retomada da sesmaria pela Coroa e a Carta de Doação seria revogada. Essa foi a primeira acepção de “terra devoluta”, isto é, àquela terra anteriormente pública, que já tinha sido repassada a um particular, mas que seria devolvida à Coroa. Para alguns historiadores, essa reversão da propriedade ao Estado, na hipótese de o imóvel encontrar-se inculto, pode ser considerada também como uma forma de limitação ao exercício do direito de propriedade (1474). 

Ocorre que colonos com sesmarias de propriedades extensas deram início ao processo de revenda da posse das terras, desviando, desta forma, o instituto da finalidade principal, que era conferir gratuitamente acesso à terra a quem interessasse explorá-la economicamente. Além disso, os próprios donatários, após exaurir o solo, expandiram seus domínios para outras áreas.

Nessa época, todo o regime era controlado pelo Governador Geral, que beneficiava apenas as elites com as Cartas de Doação, deixando de fora os primeiros ocupantes do país (indígenas) e os portugueses que tinham pouca renda. Assim, em face desse contexto, ainda em 1822, a situação das terras no Brasil tornou-se caótica, resultando no fracasso do Regime Sesmarial. Os donatários não possuíam recursos para manter as terras produtivas e, por isso, as vendiam à terceiros e, a longa distância que separava o Brasil de Portugal, dificultava a fiscalização do Regime.

Por via de consequência, o intervalo existente entre 1822 e 1850 constituiu um período lacunoso em relação à propriedade no Brasil, que, por não haver legislação definida, houve um processo de apossamento de terras, favorecendo a formação do latifúndio, uma vez que a posse passou a configurar o mais novo modo de aquisição de terras.

Naquela época, D. Pedro I suspendeu quaisquer concessões de sesmarias até que a Assembleia-Geral Constituinte deliberasse sobre o assunto, o que acabou não ocorrendo. A nova Carta (1891) garantiu o direito de propriedade, mas foi omissa em relação a disciplinar a forma legal para aquisição das terras e qual sua função primordial.

2. Terras Devolutas

Só em 1850, com a promulgação da Lei de Terras (Lei nº 601, de 18.09.1850) a posse deixou de ser a única forma de aquisição do domínio no Brasil, uma vez que a nova lei passou a regulamentar as bases através das quais o Estado conferiria legitimidade à propriedade. 

Como havia abundância de terras, a posse representou não apenas a forma de ocupação do pequeno lavrador sem condições de solicitar uma sesmaria; ela acabou se tornando a prática comum (Mueller 2016, 20). No final do século 18, a situação fundiária no Brasil era caótica. Não havia qualquer controle sobre quem possuía qual pedaço de terra. À medida que se expandia a atividade econômica e a busca por novas áreas, aumentavam os conflitos e litígios judiciais pela posse da terra (Zenha 1952, 433). Igualmente confuso era o panorama jurídico-institucional, no qual um emaranhado de textos legais, incompreensíveis e muitas vezes contraditórios regulavam as sesmarias (Nozoe 2006, 599). Esta situação crítica levou o poder público a suspender a concessão de sesmarias até que fosse editada uma nova legislação.

 A Lei de Terras proibiu a aquisição de terras públicas através de qualquer outro meio que não fosse a compra, extinguindo as formas de adquirir terras por meio de ocupação e através de doações pela Coroa. Foi nesse momento que houve uma inversão do papel do Estado quanto à identificação e demarcação da propriedade: o Estado assumiu a conduta de discriminar e demarcar suas terras (terras devolutas), e não mais o proprietário privado que comprovava e identificava as terras através do cultivo.

A citada Lei nº 601/1850, em seu art. 3º, se interpretada a contrário sensu, anistiou às ocupações irregulares ocorridas até a sua publicação, como se observa abaixo:

Art. 3º São terras devolutas:

  • 1º As que não se acharem aplicadas a algum uso público nacional, provincial ou municipal.
  • 2º As que não se acharem no domínio particular por qualquer título legitimo, nem forem havidas por sesmarias e outras concessões do Governo Geral ou Provincial, não incursas em comisso por falta do cumprimento das condições de medição, confirmação e cultura.
  • 3º As que não se acharem dadas por sesmarias, ou outras concessões do Governo, que, apesar de incursas em comisso, forem revalidadas por esta Lei.
  • 4º As que não se acharem ocupadas por posses, que, apesar de não se fundarem em título legal, forem legitimadas por esta Lei. (grifo nosso).

 Excluídas, portanto, as terras sobre as quais a posse se encontrava legitimada pela Lei nº 601/1850, o restante das terras brasileiras seria considerada ‘devoluta’, de titularidade do Império, e só poderia ser adquirida através da compra e venda. Assim, a partir de 1850 a expressão ‘terra devoluta’ passou a ser concebida como toda terra do país que não tivesse título de domínio ou de uso reconhecido pelo Estado.

Com o ressurgimento econômico baseado na cultura agrícola a Lei de Terras tornou-se ineficaz no que concerne aos Barões do Café, pois os estados, principalmente aqueles produtores de café, fizeram pressão para a ocupação de terras e acabaram recebendo da Coroa as terras devolutas, sendo que, mais tarde, a Constituição Republicana de 1891 legalizou a concessão dessas terras aos Estados.

Art. 64 – Pertencem aos Estados as minas e terras devolutas situadas nos seus respectivos territórios, cabendo à União somente a porção do território que for indispensável para a defesa das fronteiras, fortificações, construções militares e estradas de ferro federais.

3. O Direito de Propriedade nas Constituições Brasileiras e Leis Ordinárias

A Constituição Federal de 1934, que recebera influência da Constituição Weimar (1919), garantiu o direito de propriedade e proibiu o seu exercício contra o interesse social. Além disso, tratou do Direito de Propriedade no Capítulo referente aos “Direitos e Garantias Individuais” e no Título “Da Ordem Econômica e Social,” direcionando o seu exercício ao atendimento do interesse coletivo e da economia nacional.

Os Textos de 1934 e 1937 trouxeram o mesmo tratamento conferido pela Constituição de 1891 às terras devolutas, muito embora em 1934, a propriedade tenha sido direcionada para fins sociais.

Há, porém, uma dicotomia entre o que é previsto na Constituição e a realidade porque a maior parte dos “sem terra” ou se apresentava como posseira, grileira, ou achava-se atrelada a um sistema de exploração do seu trabalho por um grande latifundiário, sem direito à propriedade. A lei complementar não criava mecanismos adequados para estabelecer igual oportunidade para todos.

A ruptura institucional ocasionada pelo Estado Novo fez surgir a Constituição outorgada de 1937 e, infelizmente, revestida de autoritarismo, faz renascer o caráter absoluto da propriedade. Destaca-se que, à época, vigorava o Código Civil de 1916 que, embora considerado como um ordenamento jurídico brilhante, fora elaborado sob os ideais da Revolução Francesa, ou seja, de cunho individualista, regulando o direito de propriedade no Livro II sob a denominação “Do Direito das Coisas”.

O art. 524 do citado Código de 1916 dispunha da seguinte forma: “a Lei assegura ao proprietário o direito de usar, gozar e dispor de seus bens, e de reavê-los do poder de quem quer que injustamente o possua”. Como se nota, não há um conceito do direito de propriedade, o Código tratava da forma de exercer o direito do proprietário.

Segundo Orlando Gomes, o autor do Código Civil de 1916, Clóvis Beviláqua, considerava a propriedade como um direito que “o proprietário poderia dispor, arbitrariamente, da sua substância e das utilidades de uma coisa, com a exclusão de qualquer outra pessoa.”

Somente com a adoção do Código Civil de 1916 (Lei nº 3.071/1916), o registro público passou a ser requisito essencial para a constituição e transmissão dos direitos de propriedade. De acordo com esta lei, a propriedade só poderia ser adquirida com a transcrição do título de transferência no RGI. Assim, o registro público do imóvel é ato constitutivo do direito de propriedade, isto é, sem o registro não se adquire a propriedade. Esta regra jurídica foi mantida pelo novo Código Civil, instituído pela Lei nº 10.460/2002. 

 Destaca-se que, até hoje, a Lei Federal nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, é o instrumento que regula os registros públicos (LRP) no Brasil.

Após a edição do Código Civil de 1916 e, paralelamente às Constituições citadas (décadas de 1930 e 1940) , novas leis foram editadas com a finalidade de proteger a indústria e a economia em razão das reivindicações sociais da década de 1930, tais como: o Código Florestal (Decreto 23.793, de 23 de janeiro de 1934), o Código de Minas (Decreto Federal 24.643, de 10 de julho de 1934), o Código de Águas (Decreto nº 24.643, de 10 de julho de 1934), a legislação que regula a proteção do patrimônio histórico, artístico e cultural (Decreto-Lei nº 25, de 30 de novembro de 1937), entre outras.

O Código Florestal já dispunha sobre a importância do meio ambiente e considerava as florestas como bem de interesse comum de todos os habitantes do país, além de estabelecer que o direito de propriedade deveria ser exercido com limitações.

A Carta de 1946, que reconduziu o Brasil ao ideal democrático, além de condicionar o direito de propriedade ao interesse social, previu a desapropriação pela mesma motivação, e estabeleceu a exigência de que a indenização por desapropriação fosse paga previamente e em dinheiro tal como ocorre até os dias de hoje. 

Em 1964, foi editado o Estatuto da Terra (Lei Federal nº 4.504/1964), que tratou do conceito de “terras devolutas”, inserido do capítulo dedicado às terras públicas, permitiu que o Instituto Brasileiro de Reforma Agrária – INCRA, promovesse a discriminação dessas terras, conforme disciplinado no Decreto-Lei nº 9.760, de 5 de setembro de 1946, com a autoridade para reconhecer as posses legítimas manifestadas através de cultura efetiva e morada habitual, bem como para incorporar ao patrimônio público as terras devolutas federais ilegalmente ocupadas e as que se encontrarem desocupadas.

Já no ano de 1967, foi semi-outorgada uma nova Constituição, cuja criação se deu durante o regime militar (AI n° 4), que assegurava o direito de propriedade e o condicionava ao interesse social. 

Anos depois, o Congresso Nacional editou a Lei Federal nº 6.383, de 7 de dezembro de 1976, que dispõe sobre o Processo Discriminatório de Terras Devolutas da União, complementando as disposições sobre o procedimento administrativo trazido pelo Decreto-Lei nº 9.760/46, com normas de cunho processual, a fim de especificar o rito da discriminação dessas terras nos tribunais. Esta norma elencou hipóteses de legitimação da posse exercida sobre as terras públicas, são elas: i) que o ocupante não seja proprietário de imóvel rural; ii) que comprove a moradia permanente e cultura efetiva pelo prazo mínimo de 1 (um) ano.

A regularização da ocupação acabou gerando uma Licença de Ocupação, pelo prazo mínimo de mais quatro anos, findo o qual o ocupante teria a preferência para aquisição do lote, utilizando-se dos critérios relativos à ancianidade da ocupação, às diversificações das regiões em que se situasse a respectiva ocupação e à dimensão de área.

No tocante à propriedade territorial rural, o legislador constitucional, inspirado no Estatuto da Terra, estabeleceu que a desapropriação não seria paga em dinheiro e sim com títulos da dívida pública, no caso de descumprimento da função social.

Nota-se que, entre as décadas de 1930 e 1960, foram editadas duas versões do Código Florestal: a primeira, o Decreto Federal nº 23.793, de 23 de janeiro de 1934 e, a segunda, que foi promulgada com o fim do Estado Novo e o restabelecimento da vida democrática brasileira. Aliás, este pode ser considerado um período de grande profusão na legislação ambiental, a Lei Federal nº 4.771, de 18 de setembro de 1965 foi editada e denominada nos meios jurídicos como o “Novo Código Florestal” em alusão ao Código de 1934.

Vale destacar que, no Brasil, desde a vigência das Ordenações Afonsinas, legislação portuguesa em vigor na primeira década após o descobrimento, há referência acerca dos recursos naturais brasileiros, em razão do emprego de madeiras para o incremento da expansão marítima portuguesa. Entretanto, a ótica utilizada pelo legislador até a década de 1960 do século XX é utilitarista. Segundo Antônio Herman Benjamin: “esta, foi a fase da exploração desregrada ou laissez faire ambiental, em que a conquista de novas fronteiras (agrícolas, pecuárias e minerárias) era tudo que importava na relação homem-natureza.

No entanto, foi apenas na Constituição de 1988 que foi promulgada e proclamada o princípio da função social da propriedade e elevada a esta o status de direito fundamental (art. 5,º XXII e XXIII, CRFB). Além disso, a propriedade voltou a ser incluída entre os princípios da ordem econômica, no intuito de assegurar a todos a existência digna, conforme os ditames da justiça social (art. 170, III, CRFB).

Nessa seara, a partir do momento em que a função social foi regulada na Constituição, o conceito de propriedade foi alterado, passando a ser interpretado sob o prisma dos valores e princípios fornecidos pela nova Carta.

Atualmente, no Código Civil vigente (2002), em seu art. 1225, o direito de propriedade está previsto como sendo um dos direitos reais, que igualmente discrimina outros direitos dessa natureza, a saber: a superfície, as servidões, o usufruto, o uso, a habitação, o direito do promitente comprador do imóvel, o penhor, a hipoteca e a anticrese. Importa mencionar, por fim, que o caput do referido artigo do Código Civil brasileiro dispõe que “o proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha” e que “o direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas”.

Dessa forma, percebe-se que o titular do direito de propriedade continua a ter o direito de usar, gozar e dispor da coisa, mas não no sentido absoluto, perpétuo e exclusivo, devido à inserção da função socioambiental da propriedade, já que o domínio é assegurado ao proprietário, desde que, o exercício do direito esteja submetido às suas finalidades econômicas e sociais e à preservação dos recursos ambientais.

Vale esclarecer, que outras normas, com assento constitucional, como é o exemplo do art. 225 da CRFB/1988, também direcionam a propriedade ao cumprimento da função socioambiental. Isso acontece, por exemplo, quando o proprietário ou possuidor elabora o Cadastro Ambiental Rural – CAR e mantém, a título de Reserva Legal, o percentual de floresta exigido pelo art.12 da Lei Federal nº 12.651, de 25 de maio de 2012, que dispõe sobre a proteção da vegetação nativa. Além disso, quando se abstém em suprimir vegetação de Mata Atlântica, nos termos do art. 11 da Lei Federal nº 11.428, de 22 de dezembro de 2006, que veda o corte e a supressão de vegetação primária ou nos estágios avançado e médio de regeneração do Bioma Mata Atlântica de espécies da flora e da fauna silvestres ameaçadas de extinção, entre outras hipóteses para o atendimento a legislação ambiental.

 Nota-se que é a norma que determina como o proprietário usará o bem. Pode-se dizer, então, que, no caso, o novo Código Florestal (2012) é que norteia a utilização da propriedade de acordo com o dispositivo e a tipologia da propriedade (rural, urbana, se há presença de recurso hídrico, restinga, dentre outras características).

Portanto, conclui-se que a legislação brasileira evoluiu muito desde o descobrimento e a colonização do país, mas, devido à ausência de uma política de regularização fundiária que favorecesse todas as camadas sociais de forma equânime, a ilegalidade e a informalidade documental no campo e na cidade sempre estiveram presentes como formas para a aquisição e manutenção da propriedade. 

4. Conclusão

Em pleno século XXI observa-se que ainda há vários entraves a serem vencidos no que diz respeito à questão fundiária brasileira, considerando que:

  1. No Brasil a informalidade (posse) no processo de ocupação foi a forma que vigorou para se adquirir a propriedade, considerando o fracasso do Regime de Sesmarial.
  2. Após esse período sesmarial, houve um período lacunoso com diversos conflitos de como seria possível, legal e legítimo obter o acesso à terra.
  3. A Lei de Terras buscou regular a questão da ocupação e a posse de terras, buscando disciplinar o seu acesso por meio da compra e venda e demais instrumentos, como a definição de terra devoluta e a possibilidade de doação de terras pela Coroa Portuguesa.
  4. No Brasil, apenas em 1916, o registro do imóvel passou a ser constitutivo do direito de propriedade, o que gerou uma cultura da informalidade documental no país.
  5. O custo para transferência e/ou regularização dos imóveis é cada vez mais alto devido à burocracia e a busca pela segurança jurídica do direito de propriedade. 
  6. A máquina pública não contribui para tornar menos onerosa a regularização dos bens imóveis. Exemplo disso, são os custos para a transferência de um bem em que haverá um dispêndio considerável com escritura pública de compra e venda no Cartório de Notas, certidões pessoais e reais, custo de profissional habilitado com planta e memorial descritivo, Certificado de Cadastro de Imóvel Rural (CCIR), comprovantes de pagamento do ITR, certidão negativa de débitos do IBAMA, pagamento antecipado pelos atos que serão praticados no RGI, custas cartoriais, pagamento do Imposto de Transmissão de Bens Imóveis (ITBI), entre outros.
  7. Caso o imóvel não cumpra todos os requisitos legais e o interessado não puder cumprir com as exigências, é iniciado um procedimento judicial, no qual o juiz decidirá se os documentos apresentados são suficientes ou não para proceder ao registro.
  8. A estrutura fundiária brasileira possui outro aspecto particular, que é a dominialidade pública de grandes extensões de terra devido ao fato de o Brasil ser um país de dimensões continentais e por herança do Sistema de Capitanias Hereditárias, ou seja, possui grandes extensões de terras públicas, que podem ser de domínio da União, dos estados e dos municípios, terras devolutas ainda não identificadas, considerando que historicamente, o Poder Público nunca conseguiu manter um cadastro atualizado, com dados precisos, de suas terras.
  9. Diante dessa situação, milhares de imóveis rurais estão em situação irregular – muitos agricultores não possuem títulos de propriedade e há espaços onde não é possível afirmar com precisão quem possui os direitos de propriedade sobre a terra. Essas áreas muitas vezes correspondem aos denominados “vazios do CAR”.
  10. A violência no campo, e o mal funcionamento de mercados de terra acabam por favorecer o desmatamento ilegal, pois a irregularidade da terra, ou melhor, do registro de propriedade leva a disputas violentas pelo domínio do território quase sempre para a prática de atividades irregulares.
  11. Os cadastros criados em legislação mais recentes são muito úteis para o conhecimento das terras do Brasil e servem como ferramenta de planejamento do Poder Público em relação à incentivos, métodos de conservação da biodiversidade e prática das atividades econômicas. Entretanto, suas análises conjuntas ainda geram certa confusão, pois um acaba se sobrepondo ao outro. Por isso, é fundamental a instituição de um cadastro único. Vale lembrar, por fim, que, atualmente, existem diversos cadastros ou sistemas obrigatórios (Sistema de Gestão Fundiária (SIGEF), Cadastro de Imóveis Rurais (CAFIR), Ato Declaratório Ambiental (ADA) e o Cadastro Ambiental Rural (CAR), dentre outros.